Mães e esposas: mulheres são 70% das visitas nos presídios de Mato Grosso do Sul

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Segundo a Agepen (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário), em média há 3,2 mil visitas por mês nos presídios de Campo Grande. As mulheres somam 80% do total de visitantes nas unidades de regime fechado.

Conforme levantamento, nas unidades prisionais masculinas de regime fechado, 70% dos visitantes são esposas/conviventes, enquanto na unidade feminina os maridos ou conviventes são 18%, neste mães irmãs e filhos somam 70%.

Quem tem um filho, esposo ou irmão preso vive também um tipo de prisão, uma realidade que atinge milhares de mulheres em todo o país. E elas [mulheres] são as que mais visitam os entes nos presídios.

Não tem como abandonar

Prova disso é a dura jornada de uma jovem, de 28 anos, que há 1 ano e 9 meses, viaja de  à Campo Grande (4 horas de viagem) para visitar o marido, de 34, preso no presídio de Segurança Máxima. “Há muito preconceito, mas somos humanos né. São pessoas que erraram e, apesar do erro, não têm como abandonar. Atire a primeira pedra quem nunca errouâ€, diz a jovem.

Ansiosa para o dia em que verá novamente o marido, ela inicia a preparação na quinta-feira, quando faz as compras do que irá preparar para ele. A entrada de alimentos é rígida. Somente alimentos já prontos e no máximo 2 kg em potes transparentes. Apenas para a refeição do dia.

No dia seguinte, a esposa pega o último ônibus já à noite, pois trabalha, e chega na madrugada de sábado na Capital. A moça fica na casa de parentes e descansa até as 5h, quando se prepara para seguir para o presídio.

Às 7h, a frente do estabelecimento penal já fica lotada, como é muita gente, cerca de 300, os visitantes se organizam com uma lista de chegada. Primeiro, é recolhida a carteirinha de visitante, que todos devem ter, em seguida, às 9h, começam a ser chamados a cada dez pessoas.

Mulheres dominam a entrada de presídios em dia de visita (Foto: Marcos Ermínio, Arquivo Midiamax)

Comida ainda é fiscalizada, mas revista íntima mudou

Na entrada, há uma mesa onde os potes com alimentos são revistados. “Eles abrem o pote e apertam a comida para ver se tem algum objeto, em seguida colocam em uma máquina de raio-X, para visualizar melhorâ€, explica.

Um dos pontos positivos para ela foi a alteração na revista íntima. “Antes a gente tinha que tirar a roupa, era bastante constrangedor, hoje existe o raio-x e a gente passa pela máquina e eles conseguem visualizar tudo e depois subimos para o pavilhãoâ€, conta.

O encerramento da visita ocorre às 15h. “Como é muita gente, nem todo mundo entra às 9h, mas todos têm que sair às 15h. Então, quanto mais cedo chegar, mais tempo com elesâ€, afirma.

Além do desgaste desta rotina, ainda tem os gastos. “Tudo paga. Eu gasto com passagem para ir e para vir, Uber até o presídio, pago para guardar a bolsa, pago para ir ao banheiro. Tudo tem custoâ€.

Criança nunca visitou o pai

Mãe de uma menina de 3 anos, ela, a pedido do marido, nunca levou a filha para visitá-lo. “Ele não está preparado para ver ela lá dentroâ€, conta, explicando ainda que a filha chora de saudades do pai, mas que conta que ele está trabalhando.

“Ficar na cadeia tira a sua paz, faz você ter raiva, mas você se torna errada se quiser. Eu creio que tudo pode mudar, quando você decide mudar. A esperança agora é ver meu marido aqui fora já em janeiro. Se Deus quiser, agora falta poucoâ€, diz animada.

Mãe vê o filho a cada 3 meses

Do mesmo sentimento compartilha a mãe de um rapaz, de 32 anos, que está preso em Dois Irmãos do Buriti. A mulher, de 56 anos, conta que vive essa realidade desde 2012. O filho cometeu alguns delitos e permanece preso até hoje.

A visita acontecia aos domingos, mas após a pandemia foram liberadas duas visitas ao mês e ainda divide com a nora, então acaba visitando o filho a cada dois, três meses, até por conta da distância que dificulta, já que a mãe mora em Campo Grande.

Ela também leva uma vasilha com no máximo 2 kg de alimentos no total, este ainda é pesado para conferir se está dentro da norma. Como tem que levar tudo em uma vasilha, ela leva apenas comida salgada.

“A gente leva o que ele gosta, porque para nós não faz diferença. A gente come bem aqui fora. Como particularmente eu gosto de , eu levo carne para ele também, eu sei que lá ele não tem carne. Doce a gente não leva porque é só uma vasilha. Doce ele come lá na cantina, que é superfaturada, mas a gente ajuda como podeâ€, detalha.

Reforma de presídios é saída para acabar com superlotação
Reforma de presídios é saída para acabar com superlotação. Foto: Assessoria

Emocional é o que mais pesa no dia de visita

Ela conta como é a preparação para visitar o filho. “Sempre que antecede a visita eu durmo mal. O emocional é o mais pesado. É uma noite sem dormir, porque o problema não é ir visitar o preso. É o ambiente que é pesado. Os agentes nos tratam como se fôssemos do crime também. Generalizam. Nesses 10 anos que ‘caminho’ dentro dos presídios, o de Coxim foi uma exceção, onde os agentes foram educados, ajudavam e tratam com educaçãoâ€, reclama.

Assim como a jovem que visita o esposo, a mulher fala sobre ter mudado a revista íntima. “Hoje, graças a Deus, a visita não precisa mais tirar a roupa. Antigamente a gente tinha que ficar nua na frente das agentes. Hoje tem detector de metais e raio-x, uma coisa que evoluiu bastanteâ€.

Sobre a questão das mulheres serem maioria nas visitas, ela explica que pode estar ligada à sensibilidade e ao instinto materno. “Há casos de pais desistirem, mas as mães nunca desistem. Até minha mãe velhinha fazia questão de visitar meu filho. Eu era enfermeira e via isso por lá [hospital] também. É a vida. A esposa paga um preço e mãe também. Se fosse ao contrário, uma mulher presa, o homem não visitaria, mudaria de mulherâ€, explica.

Regras para as visitas

O dia de visita, conforme a Agepen é estabelecido de acordo o cronograma de cada unidade prisional. Geralmente ocorre aos finais de semana, normalmente duas vezes por mês, mas sempre em dias fixos e predeterminados.

Os visitantes devem ter o cartão do visitante onde constam os dados pessoais.

Conforme as normas, durante as visitas é permitida a entrada de alimentação especificamente para os visitantes, apenas um vasilhame de plástico transparente de até dois litros. Exceto nas Penitenciárias Estaduais Masculinas de Regime Fechado da Gameleira I e II, onde a entrada de alimentos é proibida.

Já a entrega de pertences ocorre em outros dias, determinados pela direção de cada unidade. Cônjuges têm direito à visita íntima mediante cartão de visita. Normalmente, feita uma vez ao mês, também de acordo com o cronograma estabelecido pela direção.

Os policiais penais são treinados durante o curso de formação e contam com a ajuda do scanner corporal e o scanner de bagagem para revista de pessoas e pertences. O trabalho é feito pela equipe de plantão escalada para aquele dia, com reforço de policiais penais que trabalham durante o período da visita, conforme escalação da Chefia de Vigilância.

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