TRABALHO INFANTIL DESAFIA E CONSTRANGE TODOS NÓS

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Instituído em 2002 pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil, a 12 de junho, é uma dessas referências que enquanto persistirem no calendário seguirão ecoando uma constatação que envergonha toda a sociedade humana: a de que crianças e adolescentes seguem sendo explorados como força de trabalho em diferentes pontos do mundo.

Neste ano a data tem um significado ainda maior, uma vez que a Organização das Nações Unidas (ONU) definiu 2021 como o Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil, estabelecendo 2025 como prazo limite para a erradicação de todas as formas dessa prática desumana, que rouba a infância e o futuro de 152 milhões de crianças e adolescentes (número de 2016), segundo a OIT.

Lamentavelmente, porém, a realidade atual não deixa dúvidas sobre não haver qualquer chance de que o objetivo seja alcançado no prazo estabelecido. Principalmente porque a crise da Covid-19 agravou ainda mais a pobreza de pessoas que já estavam em situação de vulnerabilidade em todas as regiões do planeta.

Ao destacar que o agravamento da pobreza e o fechamento de escolas, impostos pela pandemia, levaram milhões de crianças a serem obrigadas a trabalhar para contribuir com a renda familiar, publicação da OIT adverte que tal situação “pode reverter anos de avanço no combate ao trabalho infantilâ€.

Nos últimos vinte anos, cem milhões de crianças foram ‘resgatadas’ do trabalho infantil, diz a OIT, apontando que somente entre os anos 2000 e 2016 o número de crianças e adolescentes submetidos às mais diferentes formas de trabalho caiu de 246 milhões para 152 milhões.

São estatísticas sombrias, pois o avanço – que agora se teme seja revertido pelas consequências da pandemia – nada significou para o contingente absurdo de 152 milhões de crianças e adolescentes, de 5 a 17 anos, que estavam trabalhando em 2016.

Ainda mais desalentador é constatar que a esmagadora maioria dos que têm o seu “futuro roubado†– expressão de Guy Ryder, diretor-geral da OIT – pelo trabalho infantil estão na Ãfrica (72 milhões) e na Ãsia-Pacífico (60 milhões).

Ou seja, os países e regiões que dependem fundamentalmente de capital humano melhor preparado, para reduzir a pobreza e a defasagem em relação ao mundo desenvolvido, são exatamente aqueles que, por suas próprias contingências, queimam o seu futuro ao submeter crianças e adolescentes ao trabalho.

No Brasil, embora o trabalho infantil seja ainda uma chaga social e humana longe de ser eliminada, estatísticas confiáveis apontam redução significativa nessa forma de exploração de crianças e adolescentes.

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), do IBGE, o trabalho infantil caiu 16,8% entre 2016 e 2019. Ainda assim, os números absolutos são alarmantes: Dos 38 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos, cerca de 1,8 milhão se encontravam em ‘situação de trabalho infantil’, segundo a pesquisa. Desses, 21,3% tinham de cinco a treze anos; 25% contavam até quinze anos; e 53,7% tinham entre 16 e 17 anos de idade.

Um recorte muito oportuno dessa pesquisa denuncia as atividades econômicas que no Brasil mais exploram esses ‘trabalhadores infantis’, cujas ocupações deveriam ser, exclusivamente, estudar e brincar: 27% estavam no comércio e setor de reparação, 24% na agricultura, 7% nos serviços domésticos, e 42% eram ilegalmente explorados em diversas outras atividades. A pesquisa apontou ainda que em torno de 25% dos jovens de 16 e 17 anos cumpriam jornada de mais de quarenta horas semanais.

Mesmo observando que o Brasil é reconhecido pela comunidade internacional por seus esforços para combater a exploração de crianças e adolescentes, o atual estágio não permite supor que o país vá erradicar totalmente o trabalho infantil, em todas as suas formas, até 2025, conforme prevê a meta 8.7 do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS), ratificado por todos os estados-membros da ONU.

Contudo, ainda que a meta de erradicação plena do trabalho infantil não se mostre factível no prazo previsto, seguir perseguindo tal objetivo é dever ético e responsabilidade social e humana de governos e de toda a sociedade.

*Iran Coelho das Neves é Presidente do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul.

 

 

 

 

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